10 janeiro, 2007

NOSTALGIA - Aberturas de série Clássicas

Para os fãs as aberturas de séries antigas são verdadeiras odes da nostalgia. As lembranças da infância, dos heróis e nenhuma preocupação a não ser tentar saber como o mocinho ia escapar da situação de risco imposto pelo
vilão.
Vale a pena rever:
- TERRA DE GIGANTES



- MISSÃO IMPOSSÍVEL



- BONANZA


Aguarde as próximas edições com mais aberturas.

Yes, nós não temos mais Braguinha


A música popular brasileira que há muitos anos é bombardeada por ritmos alienígenas, compositores medíocres e cantores picaretas, perdeu um dos seus maiores representantes. João de Barro, Braguinha, que faleceu no último dia 24 de dezembro, três meses antes de completar cem anos. Braguinha seria o primeiro compositor brasileiro a alcançar este feito, mas quis o destino que a história fosse diferente e na última hora mudou o roteiro. Na verdade Deus queria mesmo é que Braguinha fosse logo ficar com ele para que o compositor cantasse exclusivamente Touradas em Madri, As pastorinhas e até mesmo Copacabana e Mane Fogueteiro.

Uma das mais significativas canções do genial compositor Noel Rosa propala que “batuque é um privilégio, ninguém aprende samba no colégio”*, no entanto, no caso do então estudante Carlos Alberto Ferreira Braga a história foi bem diferente. Foi na época de colégio que o futuro João de Barro conheceu o músico Henrique Brito, que lhe ensinaria os primeiros acordes. Mais tarde ambos participariam, ainda como amadores, do grupo “Flor do Tempo”, assim chamado em homenagem à casa de um amigo do grupo que batizou a residência com este nome.

A família do jovem Braguinha não aceitava a idéia de alguém viver de música, pois achava que ficar por aí tocando violão era serviço de vagabundo. Mas o jovem fora fisgado definitivamente e por isso,para não contrariar os pais, adotou o pseudônimo João de Barro, nome pelo qual ficaria conhecido no meio musical, assim como Braguinha, pelos mais íntimos.

Ao lado dos amigos e parceiros Noel Rosa, Almirante e Henrique Brito, como profissionais, fundaram o Bando dos Tangarás. No entanto, o destino do compositor João de Barro era mesmo brilhar, mas brilhar em carreira solo com os primeiros sucessos do carnaval de 1933 como: Trem blindado (1932)

Meu bem pra me livrar da matraca/Da língua de uma sogra infernal/Eu comprei um trem blindado/Pra poder sair no carnaval (...)

Ou ainda Moreninha da praia (1932)

Moreninha querida/Da beira da praia/Que mora na areia/Todo o verão/Que anda sem meia em plena avenida/Varia como as ondas do teu coração/A tua ardência é o que me assombra/Tu tens quarenta graus à sombra (...)

Mesmo sem conhecimentos formais de música, compondo na base do assovio, Braguinha se transformou num campeão da folia, especializado em marchinhas como Linda lourinha, Uma andorinha não faz verão, Dama das Camélias, Balancê, que nos anos oitenta seria gravada por Gal Costa reeditando o sucesso, Pirata da perna de pau, Chiquita Bacana, marchinha que projetou a eterna Rainha do Rádio Emilinha Borba, e ainda Touradas em Madri, cantada por um Maracanã em festa na goleada do Brasil sobre a Espanha, na fatídica Copa de 1950.
Touradas em Madri (1938)

Eu conheci uma espanhola natural da Catalunha/Queria que eu tocasse castanholas e pegasse touro à unha/Caramba, caracoles/Sou do samba, não amoles/Pro Brasil eu vou fugir.../Isso é conversa mole pra boi dormir!

Na década de 30, participou como diretor e roteiristas de filmes como Estudantes (1935), Alô, alô, carnaval (1936), Banana da terra (1938),e Laranja da China (1940), todos musicais precursores das chanchadas que misturariam números musicais com correria, humor, muita pancadaria e romance. João de Barro atuou também como diretor artístico da gravadora Continental onde projetou nomes como Radamés Gnattali, Tom Jobim, Dóris Monteiro, Nora Ney, Jorge Goulart, Jamelão, Lúcio Alves e Dick Farney.

Reza a lenda que Lúcio Alves, conhecido como “O cantor das mulditinhas”, recebeu este apelido por interpretar todo o repertório de Orlando Silva, “o cantor das multidões”, teria cantado pela primeira vez a hoje clássica e icônica Copacabana, parceria de Braguinha e Alberto Ribeiro, mas a primeira gravação ficou mesmo a cargo de Dick Farney, enquanto Lúcio excursionava pelos Estados Unidos. Copacabana se transformaria numa precursora da Bossa Nova, graças também a personalíssima interpretação de Dick Farney.

Copacabana (1946)

(...) Copacabana, princesinha do mar/Pelas manhãs, tu és a vida a cantar/E à tardinha, o sol poente/Deixa sempre uma saudade na gente (...)

Em 1937 Braguinha letrou um choro-canção composto por Pixinguinha e que receberia o título de Carinhoso, gravado por Orlando Silva, se tornaria um sucesso que é tocado até os dias de hoje. Carinhoso seria usado como tema de abertura da novela escrita por Laura César Muniz, realizada pela Rede Globo nos anos 70, com o mesmo título e protagonizada por Regina Duarte, Cláudio Marzzo e Marcos Paulo. A versão instrumental tocada na abertura teve arranjo e execução de Márcio Montarroyos.

João de Barro compôs em quase todos os ritmos, desde o samba-canção de inspiração rural, Mane Fogueteiro, sucesso na voz de Augusto Calheiros “a patativa do norte”; ao samba urbano modernista como o citado Copacabana e Laura ambos gravados por Dick Farney em 1946. Ele também arquitetou com delicadeza a mais impressionante coleção de discos infantis, aclimatando para o Brasil histórias da Branca de Neve, Chapeuzinho Vermelho, Alice no País das Maravilhas, além de recuperar inúmeras cantigas de roda. Quem conhece não troca jamais pelas repetitivas e alienantes canções entoadas pela “rainha dos baixinhos”, Xuxa.As letras e músicas compostas por Braguinha se ouvidas pelos pseudos compositores de músicas infantis de hoje, com certeza mudariam de profissão, caso tivessem vergonha na cara. Quem não recorda desses versos que embalaram a infância de muitas pessoas, como:

Canção do Chapeuzinho Vermelho (Pela estrada)

Pela estrada afora eu vou bem sozinha/Levando estes doces para a vovozinha/Ela mora tão longe, o caminho é deserto/E o Lobo Mau passeia aqui por perto (...)

Ou ainda Os caçadores (Chapeuzinho Vermelho)

Nós somos os caçadores/E nada nos amedronta/Damos muitos tiros por dia/Matamos feras sem conta (...)João de Barro foi embora na véspera de natal. Deixará muita saudade, mas suas marchinhas e sambas-canções são imortais. Braguinha influenciou não apenas a Bossa Nova como também inspirou os Tropicalistas com a sua Chiquita Bacana.

É triste dizer isto,mas infelizmente é a verdade – yes, nós não temos mais Braguinha!

Humberto Oliveira

*Feitio de oração, composiçaõ de Noel Rosa e Vadico

Homenagem a Jece Valadão
Com a morte em 27 de novembro do ator e diretor Jece Valadão, por incrível que pareça me veio à lembrança minha primeira emoção sentida com cinema ao vivo e a cores. Em 1976, quando eu ainda era muito jovem (onze anos) foram realizadas em Fortaleza as filmagens do longa-metragem O Homem de Papel (já exibido no Intercine Brasil e no Corujão), dirigido por Carlos Coimbra (Independência ou morte) e pelo cearense Ezaclir Aragão que também atua no filme (atua é força de expressão) e que trazia no elenco Milton Morais, Vera Gimenez e Jece Valadão.

Naquela tarde, meu tio Jairo me pegou em casa, sabendo que eu gostava de cinema, e me levou para assistir naquele dia as filmagens que seriam feitas ali perto. Não lembro se era sábado ou domingo, mas recordo muito bem da movimentação pouco antes das filmagens.Era uma cena de perseguição entre três carros, com direito a derrapagens, batidas e tiroteio. Claro que o público delirava ali nas proximidades da Avenida Duque de Caxias, naturalmente interditada para as filmagens.

Todos a postos. Ouvimos uma voz que grita “ação” e começa a perseguição. Um carro passa em alta velocidade, em seguida outro com onde um sujeito com metade do corpo fora da janela do carro e com uma arma na mão (não lembro se era uma pistola ou metralhadora, mas pela pobreza da produção mais parecia uma pistola de brinquedo).

Na multidão ouvimos apenas murmúrios. Alguém pede silêncio. E eu quase na ponta dos pés maravilhado com aquilo tudo e na época nem imaginava que com o advento do dvd poderíamos assistir os bastidores das grandes produções hollywoodianas e nacionais, ou seja, os famosos extras, tranquilamente no sofá de casa.
De repente a mesma voz grita “corta“. A equipe então agradece a colaboração de todos, desmonta rapidamente o equipamento e vai embora para outra parte da cidade para mais um take. A saída tão abrupta causa certa frustração no público e muitos comentam – “mas é só isso?”. Cinema é assim mesmo. Para mim foi o suficiente.

Quanto ao filme pronto eu só assistiria muitos anos depois. O Homem de Papel era proibido para menores de 18 anos por conter cenas de sexo e violência, hoje cenas tão banais até na televisão e o que é pior, no “horário nobre”. Pois é, e fiquei atento para ver aquela cena descrita acima durante a exibição do filme,mas acabei por constatar um grosseiro erro de continuidade.

Por fazer parte desta primeira imagem do cinema que guardo na memória, que este ALMANAQUE é dedicado a Jece Valadão “o maior cafajeste do cinema brasileiro”, mas no bom sentido.

COMO TUDO COMEÇOU...

Ele foi batizado Gecy Jece Valadão ao nascer na pequena Murunduí, Rio de Janeiro em 24 de julho de 1930. Aos nove anos a família se muda para Cachoeiro de Itapemirim, Espírito Santo (onde nasceram também o cantor Roberto Carlos e o escritor Rubem Braga) e é ali que Jece inicia aos 18 anos sua carreira artística como locutor de rádio.

OS CAFAJESTES EM CENA

Em 1949 vai para o Rio de Janeiro onde começa sua carreira de ator no teatro e também no cinema numa participação no filme Carnaval no fogo. Jece faz pontas em vários filmes, mas a consagração acontece em 1952 com Os Cafajestes dirigido por Ruy Guerra. No elenco além de Jece Valadão que interpreta Jandir, um vigarista da Zona Sul carioca, Daniel Filho como o fotografo Vavá, Norma Bengell é Leda.
Jandir (Valadão) e o amigo Vavá (Daniel Filho) que é fotografo têm como passatempo levar garotas para passear de carro em praias desertas e tirar fotos delas nuas para posteriormente fazer chantagem. Seduzida por Jandir, Leda (Bengell) se torna vítima da dupla e acaba se aliando a eles e convencendo sua prima Vilma que cai no mesmo truque.

O filme é um clássico do chamado “Cinema Novo” claramente influenciado pela “Nouvelle Vague” francesa. A seqüência de Norma Bengell nua na praia, o primeiro nu frontal do nosso cinema, iluminada pelos faróis do Buick de Vavá, provocou escândalo e o filme teve problemas com a censura.

Os Cafajestes foi o primeiro trabalho realizado no Brasil pelo diretor Ruy Guerra, nascido em 1931 em Moçambique e com larga carreira cinematográfica. No Brasil dirigiu entre outros Os Fuzis (1963), A Queda (1976) mais recentemente Estorvo (1998) baseado no livro de Chico Buarque.

O filme ganhou inúmeros prêmios como o Saci de melhor diretor (Guerra), atriz (Norma), argumento (Miguel Torres) e composição (Luiz Bonfá) e ganhando também Menções honrosas em vários festivais e o prêmio Governador do Estado de São Paulo.

JECE VALADÃO NO TEATRO, CINEMA E TELEVISÃO

No teatro o ator participou de peças como A Mulher sem pecado encenada em 1957 (a peça escrita em 1941, sendo o primeiro texto teatral de Nelson Rodrigues que dois anos depois mudaria a história do teatro com o revolucionário Vestido de Noiva). Jece atuou também em duas peças de Pedro Bloch – Os inimigos não mandam flores (1958) e Procura-se uma rosa (1960).

Em 1964 estréia como diretor justamente com a versão cinematográfica de Procura-se uma rosa. Daí para frente passa a produzir e a dirigir seus próprios filmes através de sua produtora Magnus Filmes dirigindo principalmente filmes policiais, retratando o cotidiano dos subúrbios cariocas como nos longas-metragens O mau caráter de 1974 e A noite dos assassinos realizado dois anos depois.

Na televisão atuou em telenovelas como Transas e caretas (1984), Pantanal (1990), O Dono do mundo (1991) e em Anos Dourados (1986) minissérie de Gilberto Braga onde interpretava o pai do adolescente Urubu vivido pelo ator Taumaturgo Ferreira.

A VIDA COMO ELA É...

Jece Valadão também participou nos anos 1990 do programa A vida como ela é, adaptação dos contos de Nelson Rodrigues produzidos e dirigidos por Daniel Filho (parceiro de Jece no filme Os Cafajestes). Valadão atuou em dos melhores episódios, intitulado Casal de três onde interpreta o sogro do personagem vivido por Guilherme Fontes, casado com Malu Mader, que faz uma esposa megera e que acaba arranjando um amante (Marcos Palmeira). Em virtude disso ela passa a tratar o marido com muito carinho. Claro que ele estranha a mudança, e ainda recebe uma carta anônima e vai mais uma vez falar com o sogro que filosofa dizendo – “o marido não precisa ser o último a saber, ele não precisa saber nunca” – conformado com a situação o genro não reclama mais e passa a desfrutar de uma verdadeira lua de mel em casa, mas um dia a mulher chega em casa aos prantos, indaga sobre que acontecera, ela mostra o convite de um amigo do casal que vai casar, obviamente o seu amante. O marido indignado se arma e vai atrás do noivo, mas chegando lá simplesmente obriga o amigo a acabar o noivado e que dali em diante ele iria jantar na casa deles todas as noites. Assustado só resta fazer o que o amigo está mandando e surpreendemente o episódio termina com a esposa agradecida fazendo carícias antes inimagináveis no marido que sorri satisfeito.

A participação de Jece Valadão neste episódio é impecável. Para quem quiser conferir esta história e mais trinta e nove de A vida como ela é está disponível em dvd duplo.

FILHOS DO CARNAVAL

Jece Valadão protagonizou este ano o seriado Filhos do Carnaval produzido pelo canal pago HBO e com direção de Cao Hamburguer (Castelo Rá-Tim-Bum, o filme), Flávio Tambelli (Bufo e Spalanzani) entre outros e tendo ainda no elenco Enrique Diaz, Rodrigo dos Santos, Thogum, Felipe Camargo, Mariana Lima, Maria Manoella, Felipe Martins, Felipe Wagner.

A história da série gira em torno da família "Gebara", centrada no pai "Gebarão" protagonizado por Jece Valadão ator com mais de 100 filmes na carreira, também focado no conflito entre seus 4 filhos.
A família “Gebara” vive da contravenção tendo como atividade principal o "jogo do bicho" e também controla a escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel, o enredo gira em torno da aposentadoria do pai que pretende passar o controle dos negócios a seu filho mais velho.

Filhos do Carnaval, série teve seis episódios onde Jece interpreta um bicheiro como somente ele sabia fazer. Agora com sua morte, é possível que os planos para uma segunda temporada fiquem comprometidos, pois a produção vai suar muito até encontrar outro ator para substituí-lo á altura. Quem sabe talvez Otávio Augusto que era amigo de Valadão?

CINEMA, A GRANDE PAIXÃO

Jece Valadão participou do Cinema Novo em seus primeiros tempos fazendo Rio Quarenta Graus, Rio Zona Norte o antológico O Boca de Ouro filme baseado em peça de Nelson Rodrigues e dirigido por Nelson Pereira dos Santos. Em O Boca de Ouro, Jece Valadão interpreta um bicheiro que manda arrancar todos os dentes e coloca uma dentadura de ouro.

Valadão foi casado com uma das irmãs de Nelson Rodrigues, chamada Dulce e consequentemente, mesmo não sendo aceito pela família Rodrigues por acharem que o ator ao casar com Dulce estaria dando o golpe do baú, acabaria atuando em filmes adaptados de livros e peças do cunhado como Asfalto Selvagem dirigido por J. B. Tanko (mais tarde diretor de muitos filmes protagonizados pelos Os Trapalhões), a primeira versão de Bonitinha, mas ordinária dirigida por J. P. de Carvalho e ainda A Serpente realizado em 1992, baseado na última peça do dramaturgo morro em dezembro de 1980.

Mas Valadão atuou sob a direção de Glauber Rocha em A idade da terra, nos policias, Paraíba, vida e morte de um bandido, de Victor Lima, Mineirinho, vivo ou morto de Aurélio Teixeira e interpretou o cafetão Vado de Navalha na carne dirigido por Braz Chediak baseado em peça de Plínio Marcos e ainda Eu matei Lúcio Flávio de Antonio Calmon.

O eterno cafajeste marcou presença ainda nos filmes Tieta do Agreste (1996) dirigido por Cacá Diegues. Esta adaptação do romance de Jorge Amado, resultou apenas em veículo para o estrelismo de Sônia Braga e nada mais. No filme Jece Valadão interpreta comandante Dário (que na telenovela Tieta da Rede Globo foi interpretado por Flávio Galvão).

Outra produção dos anos noventa que participou foi a refilmagem do clássico do diretor Lima Barreto, O Cangaceiro (1953) desta vez dirigida sem muita inventividade, mas com violência explicita, por Aníbal Massaini Neto. Jece interpreta o chefe da volante que tenta prender o bando do Capitão Galdino, aqui vivido exageradamente pelo canastrão Paulo Gorgulho, interpretação que passou anos luz do original do ator Milton Ribeiro. No Cangaceiro original o papel do chefe da volante foi interpretado pelo próprio direto, Lima Barreto.

JECE VALADÃO ATRÁS E NA FRENTE DAS CÂMERAS

Como diretor realizou filmes em que interpretava o papel principal alternando papéis de justiceiro, policial ou bandido, usando sempre a máscara de cafajeste e do homem mau.

De sua filmografia como diretor destacamos Procura-se uma rosa (1965), A história de um crápula (1966), A Lei do Cão (1968), As sete faces de um cafajeste e Matador profissional, ambos de 1969, O Mau caráter (1974), Nós, os canalhas (1976) e A noite dos assassinos também realizado em 1976.

A atriz Vera Gimenez, ex-mulher de Jece estrelou alguns desses filmes acima e atuaram juntos também no filme O Homem de Papel, aquele que assisti as filmagens de uma cena. O filme foi produzido pelo empresário cearense Edson Queiroz (sogro do senador Tasso Jereissati). A trama do filme é tão fraca que não vale a pena nem mesmo relatar aqui uma sinopse do filme.

UMA CARREIRA CONSAGRADA E CHEIA DE PRÊMIOS...

Durante sua carreira, Jece Valadão recebeu inúmeros prêmios como o de melhor ator em 1956 no 1º Festival de Cinema do Rio de Janeiro, o prêmio Crítica Rochester Festival Word pelo filme Navalha na carne em 1970.

A VIDA CONTINUA...

Depois de uma carreira de sucesso e de uma vida particular que incluiu seis casamentos, Jece se converte à religião protestante e passa a alugar seus estúdios e a trabalhar como produtor de programas evangélicos.

MEMÓRIAS DE UM CAFAJESTE

Em 1996 Jece Valadão escreve em parceria com a jornalista Maria Teresa Eça, um livro que recebeu o sugestivo título de Memórias de um cafajeste, lançado pela Geração Editorial. No livro o autor relata de forma sincera e bem humorada a sua trajetória no mundo artístico e também abre o jogo sobre sua vida pessoal.
Valadão relata suas origens, a luta para se tornar artista, os fracassos e sucessos, a estréia no teatro, o fascínio pelo cinema, os bastidores da televisão, seus casamentos, seus filmes, os prêmios que ganhou como cineasta,os personagens polêmicos vividos no teatro – um travesti na versão brasileira de A Gaiola das Loucas, quando foi chamado por Jorge Dória para substituí-lo, pois havia quebrado a perna, assim como o empresário que viveu no palco tendo como parceira ninguém menos que Robert Close no espetáculo Uma vez por semana de Giba Um, e sua controvertida conversão religiosa, seu encontro com Jesus e a mudança de vida, arrependimentos e planos futuros.

No final do livro Jece dá seu testemunho afirmando que Deus foi suave com ele e que Ele o chamou a seu encontro e que nem ele sabe porquê. E ironia das ironias, Jece Valadão muitas vezes dissera que não acreditava em Deus. Daí concluímos que realmente “Deus escreve certo por linhas tortas”.

Agora o absurdo dos absurdos - Jece Valadão, muitos anos antes de sua conversão, criou os 10 mandamentos do bom cafajeste, que reproduzo a seguir:

01 – Bater na mulher certa na hora certa;
02 – Amar todas as mulheres – bonitas – intensamente;
03 – Amar acima do normal aquela que lhe é especial;
04 – Cobiçar a mulher do próximo quando ela é boa;
05 – Ser capaz de amar uma criança, principalmente do sexo feminino (pois o futuro ninguém pode prever como será)
06 – Ser amigo incondicional de um amigo;
07 – É essencial que seja boêmio;
08 – Nunca se deslumbrar com nada no mundo;
09 – Ser capaz de fazer uma viagem à lua, se estiver bem acompanhado;
10 – Seguir sempre a filosofia do Vinícius: “as feias que me desculpem, mas beleza é fundamental”.
Para saber mais basta ler o livro – Memórias de um cafajeste.

Como os leitores puderam constatar, bem de acordo com o estilo sempre machista e polêmico de um homem que se autoproclamava “o maior cafajeste do cinema brasileiro”. Jece Valadão morreu aos 76 anos. Seu último trabalho é o documentário, ainda inédito, O Evangelho segundo Jece Valadão. Morre o homem,mas fica a fama.
Humberto Oliveira

09 janeiro, 2007


O adeus a Robert Altman


O mundo do cinema está mais pobre desde 20 de novembro. Morreu o cineasta Robert Altman, ganhador da Palma de Ouro em Cannes por M.A.S.H (1970), um dos poucos diretores de cinema que durante a carreira foi um indomável, um rebelde, um artista inquieto e original que nem Hollywood nem os homens de dinheiro puderam domá-lo.

Formado pela escola da televisão, dirigindo séries como “Bonanza” e “Alfred Hitchcock apresenta”, Altman se tornou um especialista da “imitação”, filmando episódios “à maneira de”, como exercício de estilo, mas acabaria se tornando conhecido filmando fora das regras dos gêneros: M.A.S.H, paródia hilariante e de humor negro sobre os horrores e a inutilidade da guerra; Quando os homens são homens (1971) subvertendo o gênero realizando um western “glacial” para mostrar como eram os verdadeiros pioneiros, ou seja, um outro modo de mostrar a história.
Em 1975 dirigiu Nashiville, uma epopéia sem maquiagens sobre a música popular americana, e que ganharia um Oscar de melhor música. Altman e seus filmes têm assinatura ou marcas registradas: trilhas múltiplas – somente em seus filmes que as pessoas falam ao mesmo tempo com vozes cortando as outras – total liberdade de ação aos atores e incentivando a improvisação nos ensaios e nas filmagens. Durante os anos 1970 foi o cineasta mais cultuado pela crítica européia e parte da americana,mas teve períodos de inexplicável obscurantismo graças ao alguns fracassos como à superprodução Popeye (1980), Kansas City (1996), Dr. T e as mulheres (2000), no entanto nunca realizou um filme medíocre, pois mesmo errando ninguém era igual a ele.

Robert Altman brindou o público com obras primas como citado M.A.S.H; Cerimônia de Casamento (1978), O Jogador (1992) uma visão ácida dos bastidores de Hollywood e recheada de citações e homenagens como à cena de abertura (um plano-sequência de quase seis minutos) quando o personagem de Fred Ward fala justamente sobre o plano-sequência que abre o clássico A Marca da Maldade de Orson Welles , Short Cuts – Cenas da Vida (1993) que seria homenageado pelo diretor Paul Thomas Anderson no seu longa-metragem Magnólia, que segue o mesmo esquema de múltiplas histórias onde os personagens acabam interagindo em algum momento da história. Ironicamente,seu último trabalho por trás das câmeras, recebeu o título no Brasil de “A última noite”.

Com a morte de Robert Altman ficamos um pouco mais a mercê de cineastas adeptos somente do cinema digital, dos efeitos especiais e do croma-kie. Nada contra o cinema escapista, mas se não fosse diretores como Martin Scorsese, Woody Allen, Orson Welles, Elia Kazan, Fred Zinnerman, Fritz Lang, Billy Wilder, David Mamet, Robert Altman entre tantos outros que sabiam muito bem o ofício de fazer filmes, o cinema não existiria.
Humberto Oliveura

Yes, nós não temos mais Braguinha
A música popular brasileira que há muitos anos é bombardeada por ritmos alienígenas, compositores medíocres e cantores picaretas, perdeu um dos seus maiores representantes. João de Barro, Braguinha, que faleceu no último dia 24 de dezembro, três meses antes de completar cem anos. Braguinha seria o primeiro compositor brasileiro a alcançar este feito, mas quis o destino que a história fosse diferente e na última hora mudou o roteiro. Na verdade Deus queria mesmo é que Braguinha fosse logo ficar com ele para que o compositor cantasse exclusivamente Touradas em Madri, As pastorinhas e até mesmo Copacabana e Mane Fogueteiro.

Uma das mais significativas canções do genial compositor Noel Rosa propala que “batuque é um privilégio, ninguém aprende samba no colégio”*, no entanto, no caso do então estudante Carlos Alberto Ferreira Braga a história foi bem diferente. Foi na época de colégio que o futuro João de Barro conheceu o músico Henrique Brito, que lhe ensinaria os primeiros acordes. Mais tarde ambos participariam, ainda como amadores, do grupo “Flor do Tempo”, assim chamado em homenagem à casa de um amigo do grupo que batizou a residência com este nome.

A família do jovem Braguinha não aceitava a idéia de alguém viver de música, pois achava que ficar por aí tocando violão era serviço de vagabundo. Mas o jovem fora fisgado definitivamente e por isso,para não contrariar os pais, adotou o pseudônimo João de Barro, nome pelo qual ficaria conhecido no meio musical, assim como Braguinha, pelos mais íntimos.

Ao lado dos amigos e parceiros Noel Rosa, Almirante e Henrique Brito, como profissionais, fundaram o Bando dos Tangarás. No entanto, o destino do compositor João de Barro era mesmo brilhar, mas brilhar em carreira solo com os primeiros sucessos do carnaval de 1933 como: Trem blindado (1932)

Meu bem pra me livrar da matraca/Da língua de uma sogra infernal/Eu comprei um trem blindado/Pra poder sair no carnaval (...)

Ou ainda Moreninha da praia (1932)

Moreninha querida/Da beira da praia/Que mora na areia/Todo o verão/Que anda sem meia em plena avenida/Varia como as ondas do teu coração/A tua ardência é o que me assombra/Tu tens quarenta graus à sombra (...)

Mesmo sem conhecimentos formais de música, compondo na base do assovio, Braguinha se transformou num campeão da folia, especializado em marchinhas como Linda lourinha, Uma andorinha não faz verão, Dama das Camélias, Balancê, que nos anos oitenta seria gravada por Gal Costa reeditando o sucesso, Pirata da perna de pau, Chiquita Bacana, marchinha que projetou a eterna Rainha do Rádio Emilinha Borba, e ainda Touradas em Madri, cantada por um Maracanã em festa na goleada do Brasil sobre a Espanha, na fatídica Copa de 1950.
Touradas em Madri (1938)

Eu conheci uma espanhola natural da Catalunha/Queria que eu tocasse castanholas e pegasse touro à unha/Caramba, caracoles/Sou do samba, não amoles/Pro Brasil eu vou fugir.../Isso é conversa mole pra boi dormir!

Na década de 30, participou como diretor e roteiristas de filmes como Estudantes (1935), Alô, alô, carnaval (1936), Banana da terra (1938),e Laranja da China (1940), todos musicais precursores das chanchadas que misturariam números musicais com correria, humor, muita pancadaria e romance. João de Barro atuou também como diretor artístico da gravadora Continental onde projetou nomes como Radamés Gnattali, Tom Jobim, Dóris Monteiro, Nora Ney, Jorge Goulart, Jamelão, Lúcio Alves e Dick Farney.

Reza a lenda que Lúcio Alves, conhecido como “O cantor das mulditinhas”, recebeu este apelido por interpretar todo o repertório de Orlando Silva, “o cantor das multidões”, teria cantado pela primeira vez a hoje clássica e icônica Copacabana, parceria de Braguinha e Alberto Ribeiro, mas a primeira gravação ficou mesmo a cargo de Dick Farney, enquanto Lúcio excursionava pelos Estados Unidos. Copacabana se transformaria numa precursora da Bossa Nova, graças também a personalíssima interpretação de Dick Farney.

Copacabana (1946)

(...) Copacabana, princesinha do mar/Pelas manhãs, tu és a vida a cantar/E à tardinha, o sol poente/Deixa sempre uma saudade na gente (...)

Em 1937 Braguinha letrou um choro-canção composto por Pixinguinha e que receberia o título de Carinhoso, gravado por Orlando Silva, se tornaria um sucesso que é tocado até os dias de hoje. Carinhoso seria usado como tema de abertura da novela escrita por Laura César Muniz, realizada pela Rede Globo nos anos 70, com o mesmo título e protagonizada por Regina Duarte, Cláudio Marzzo e Marcos Paulo. A versão instrumental tocada na abertura teve arranjo e execução de Márcio Montarroyos.

João de Barro compôs em quase todos os ritmos, desde o samba-canção de inspiração rural, Mane Fogueteiro, sucesso na voz de Augusto Calheiros “a patativa do norte”; ao samba urbano modernista como o citado Copacabana e Laura ambos gravados por Dick Farney em 1946. Ele também arquitetou com delicadeza a mais impressionante coleção de discos infantis, aclimatando para o Brasil histórias da Branca de Neve, Chapeuzinho Vermelho, Alice no País das Maravilhas, além de recuperar inúmeras cantigas de roda. Quem conhece não troca jamais pelas repetitivas e alienantes canções entoadas pela “rainha dos baixinhos”, Xuxa.
As letras e músicas compostas por Braguinha se ouvidas pelos pseudos compositores de músicas infantis de hoje, com certeza mudariam de profissão, caso tivessem vergonha na cara. Quem não recorda desses versos que embalaram a infância de muitas pessoas, como:

Canção do Chapeuzinho Vermelho (Pela estrada)

Pela estrada afora eu vou bem sozinha/Levando estes doces para a vovozinha/Ela mora tão longe, o caminho é deserto/E o Lobo Mau passeia aqui por perto (...)

Ou ainda Os caçadores (Chapeuzinho Vermelho)

Nós somos os caçadores/E nada nos amedronta/Damos muitos tiros por dia/Matamos feras sem conta (...)
João de Barro foi embora na véspera de natal. Deixará muita saudade, mas suas marchinhas e sambas-canções são imortais. Braguinha influenciou não apenas a Bossa Nova como também inspirou os Tropicalistas com a sua Chiquita Bacana.

É triste dizer isto,mas infelizmente é a verdade – yes, nós não temos mais Braguinha!
Humberto Oliveira
*Feitio de oração, composiçaõ de Noel Rosa e Vadico