31 janeiro, 2007


Ruy Castro, um cinéfilo para sempre


Meu primeiro contato com a obra do jornalista e biografo Ruy Castro aconteceu nos início dos anos 90 quando a Companhia das Letras lançou de sua autoria, O Anjo Pornográfico, biografia definitiva do dramaturgo Nelson Rodrigues. Desde então aguardo ansioso cada livro novo, cada nova biografia.

De lá para cá,nós leitores, temos à nossa disposição jóias como Chega de Saudade – A História e as histórias da Bossa Nova; Saudade do século XX; Estrela solitária – um brasileiro chamado Garrincha; Ela é carioca; A onda que se ergueu no mar; Carmen entre outros. Isso sem mencionar a assídua colaboração em jornais, revistas, e prefácios de livros alheios,a organização da obra não-teatral de Nelson Rodrigues e dos livros Um filme é um filme – o cinema de vanguarda dos anos 60, de José Lino Grunewald e Um filme por dia – crítica de choque (1946 a 1973),de Antonio Muniz Viana, lançados pela Companhia das Letras em 2001 e 2004, respectivamente.

O feitiço virou contra o feiticeiro quando a mesma editora lançou no final de 2006 mais um volume desta coleção sobre cinema intitulado Um filme é para sempre, com artigos de Ruy Castro organizados pela jornalista Heloísa Seixas, sua mulher na vida real. Ruy Castro acostumado a organizar e divulgar a obra dos outros, demorou para aceitar a proposta feita pela editora e por Heloísa. Mas no final das contas, Ruy acabou vencido pelo argumento que eles usaram,ou seja, fato da qualidade incontestável do material.

Heloísa Seixas suou muito para organizar os textos publicados em jornais e revistas entre 1975 e 2006, mas valeu a pena tanto trabalho. O leitor não tem do que reclamar. Mas não espere encontrar neste livro artigos sobre filmes como Casablanca, Cidadão Kane ou Um corpo que cai,porém terá o prazer de ler textos deliciosos sobre figuras como Orson Welles, Billy Wilder, Alfred Hitchcock, Humphrey Bogart e Fred Astaire, para citar alguns. E a lista é enorme.

O texto de introdução da organizadora, é quase um trailer sobre o leremos a seguir. Começa com “A engenharia dos musicais” enfocando lendas como Busby Berkeley, que dirigiu filmes como Cavadoras de Ouro e Rua 42,ambos de 1933, Bob Fosse (Cabaret, All that jazz), Gene Kelly (Sinfonia de Paris, Cantando na chuva) ,e claro, Fred Astaire (Picolino, Meias de seda).

Tem mais: James Dean – a morte do Superboy em Pequenópolis, onde ele revela que Dean era rebelde apenas nos filmes e que na vida real a única vez em que passou dos limites acabou morrendo naquele acidente automobilístico. Em dois artigos – Porta voz da minoria adulta e Todos os detalhes sujos, sobre ninguém menos que o genial Woody Allen. Nos dois textos ficamos sabendo que Allen nada tem de tímido, sobre o escândalo que muitos pensaram que levaria a carreira do cineasta para o vinagre, e não poupa Mia Farrow, a quem um biógrafo chama de “mulher com sérios problemas mentais” ou “uma mera babá da Unicef”, uma referência maldosa a mania de Mia de adotar crianças com o mesmo problema dela. Nesta biografia citada por Ruy Castro, o autor ressalta que apesar de Allen sempre negar que seus filmes não sejam biográficos, na verdade seus roteiros dizem o contrário. Assista e confira.

Destaque também para John Wayne – enterrado junto com o Western, Wayne faleceu em 11 de junho de 1979, depois de anos de luta contra o câncer. Ou ainda, Os ternos também amam – uma nova visão sobre Shane (Ruy nunca cita este filme pelo seu título em português, Os brutos também amam).

Emoções da matinê, sobre os 231 seriados produzidos entre 1929 e 1955 nos estúdios da Republic, Universal, Columbia e Mascot. Cita seriados como Perigos de Nyoka (1942); As aventuras do Capitão Marvel (1941) e O Fantasma (1943) os dois últimos estrelados pelo atlético Tom Tyler , que atuou no clássico No tempo das diligências (1939) de John Ford.

Não poderia de citar o artigo intitulado Jerry, monstruoso gênio, sobre Jerry Lewis e sua mania de grandeza, insegurança e egocentrismo que acabou por afastar o parceiro Dean Martin. As revelações sobre as atitudes do comediante de filmes como Bagunceiro arrumadinho e a versão original de O Professor aloprado, mostram que realmente ele era um gênio, mas também um monstro.

O que dizer do filme Freaks (no Brasil, Monstros) rodado em 1932 pelo cineasta Tod Browning (Drácula). Freaks foi banido das telas americanas, não por ser violento, mas pelo fato de mostrar aberrações reais expostas num circo. Se você ficou curioso sobre o filme de Browning, ele está disponível em dvd. No livro, Ruy Castro dedica textos inspirados para filmes como Gilda (1946) de Charles Vidor e estrado por Rita Hayworth e Glenn Ford e revela que Gilda é mesmo um filme homo, bi e tudo mais que a imaginação do leitor permitir. Claro que no filme tudo está tudo devidamente escondido em subtextos. Repare nos olhares. Mas existe espaço também para uma homenagem, digo,uma declaração de amor ao que muitos consideram, incluindo eu, o melhor musical da história do cinema – Cantando na chuva (1952) no texto intitulado Uma serenata para o maior musical do cinema.

Leia o artigo e se puder alugue ou compre o dvd duplo de Cantando na chuva e se delicie com as presenças iluminadas de Cyd Charisse (as pernas mais bonitas do cinema); Debbie Reynolds (linda no esplendor dos seus 19 aninhos); Donald O’Connor, o parceiro ideal para Gene Kelly, Jean Hagen, que interpreta uma atriz do cinema mudo e que tem uma voz horrível, mas Ruy revela que na verdade aquela voz irritante, Jean fazia de propósito e que quando Debbie Reynolds canta e encanta, aquela voz sim é de Jean Hagen. Surpresa! Ah, ia esquecendo. O número de Gene Kelly cantando e dançando Sing in the rain é realmente genial, não graças apenas as proezas de Gene, mas a genialidade de um jovem chamado Stanley Donen.

Sei que muitos vão achar exagero a minha confissão, mas estou sendo sincero. Ao ler estes artigos de Ruy Castro do livro Um filme é para sempre, infelizmente me sinto um analfabeto. Vai escrever bem assim lá na casa do meu amigo Marcos Souza.

Humberto Oliveira

30 janeiro, 2007


Com vocês, Tom Jobim - Maestro Soberano

O produtor e diretor Roberto de Oliveira, depois de entregar para o público nada mais que doze dvds contendo toda a trajetória de um dos maiores compositores brasileiros,Chico Buarque. Agora nos traz três novas pérolas que não podem faltar na sua coleção. Tom Jobim – Maestro soberano será lançado numa caixa com três dvds em comemoração aos 80 anos de Antonio Carlos Jobim (25/09/27 – 08/12/94).

Os três DVDs, dirigidos por Roberto Oliveira, destacam aspectos fundamentais formadores da obra e do gênio de Tom. O primeiro,intitulado “Chega de Saudade” com narração de Nelson Motta, faz um amplo painel da criação da Bossa Nova, e sua conseqüente disseminação mundial. O segundo disco, "Águas de março" enfoca a relação de Tom com a ecologia, e é narrado por Chico Buarque, amigo e parceiro em canções como “Eu te amo”;Retrato em branco em preto”, “Sabiá”, “Pois é” entre outras. O terceiro episódio, "Ela é carioca", prioriza a ambientação da obra de Jobim no Rio de Janeiro e a paixão do maestro pela cidade, com narração de Edu Lobo.

Os documentários apresentam imagens clássicas de Tom - como o dueto com Elis Regina em "Águas de março" - e também momentos raros da filmografia sobre o maestro - como o espirituoso flagrante do encontro com Edu Lobo no estúdio, durante a gravação do álbum feito pela dupla em 1981. Álbum antológico e que traz jóias do repertório dos dois como “Chovendo na roseira”, de Tom, “Pra dizer adeus”, de Edu, “É preciso dizer adeus”, última parceria de Tom e Vinicius; “Canto triste”, parceria de Edu e Vinicius. Se ouvir já é estar perto do paraíso, imagine ouvir e ver.

Roberto de Oliveira traz também dois shows antológicos de Jobim e a Banda Nova - um gravado em São Paulo, em 1990, outro no Rio, em 1985 – permeados por registros históricos com o melhor do criador: "Chega de saudade", "Chovendo na roseira", "Estrada do sol", "Boto", "Luiza", "Correnteza", "Água de beber" entre tantas outras.

A herança de Jobim também é flagrada nas imagens do show de Reveillon de 1996, na Praia de Copacabana, em que Caetano Veloso, Chico Buarque, Paulinho da Viola, Milton Nascimento, Gal Costa e Gilberto Gil prestam tributo ao mestre. E também na apresentação do Quarteto Jobim-Morelenbaum, formado por Paulo e Daniel Jobim, Paula e Jaques Morelenbaum.

Para os seguidores de Jobim, que têm na fé em Antonio o caminho da salvação pela música, o dia 25 de janeiro equivale a um segundo natal, 80 anos depois do nascimento do mestre e 50 desde o lançamento da pedra fundamental de sua obra.

Para que você tenha uma idéia das maravilhas que estes dvds reservam entre as mais de cinqüenta canções divididas entre os três discos: Eu não Existo sem você (Tom Jobim / Vinicius de Moraes), a inevitável Chega de Saudade (Tom Jobim / Vinicius de Moraes), Se é por falta de Deus (Tom Jobim / Dolores Duran), a valsa tema da série homônima produzida pela Rede Globo nos anos 90, Anos Dourados (Tom Jobim / Chico Buarque),os primeiros sucessos como Incerteza (Tom Jobim e Newton Mendonça), Tereza da Praia (Tom Jobim e Billy Blanco), Lamento do Morro (Tom Jobim / Vinicius de Moraes), A Felicidade (Tom Jobim / Vinicius de Moraes), Se Todos Fossem Iguais a Você Estrada do Sol (Tom Jobim / Vinicius de Moraes), Eu Sei que Vou te Amar (Tom Jobim / Vinicius de Moraes) e claro Desafinado (Tom Jobim / Newton Mendonça) entre outras maravilhas imperdíveis e eternas do nosso cancioneiro popular.
Quando Tom Jobim faleceu, eu ainda morava em Fortaleza e soube quando passava por uma residência que estava com a televisão ligada e com o som que dava para ouvir da rua. Voltava do cinema com minha namorada Katia, hoje minha mulher, e ouvimos juntos a triste notícia. Naquele momento meus olhos ficaram marejados. O Brasil perdera um dos seus maiores artistas. De lá para cá muitas outras perdas aconteceram, mas nenhuma como a daquela fria noite.
Humberto Oliveira
The Hit, estética inglesa anos 80 de Stephen Frears


The Hit (1984), o filme que revelou o diretor inglês Stephen Frears para Hollywood dirigiu filmes como Ligações perigosas (Glenn Close), Os imorais, (produzido por Martin Scorsee), Alta Fidelidade entre outros será lançado em breve em dvd, com o horroroso subtítulo - O Traidor.

Neste thriller policial Terence Stamp faz um ex-gângster que testemunha contra os "colegas" da máfia no tribunal e por isso, tem que viver escondido numa aldeia rural na Espanha, onde crê estar a salvo da vingança deles. Mas dez anos depois, dois assassinos contratados vividos por John Hurt (O Homem elefante) e Tim Roth (Tempo de Violência) são enviados a Espanha para o raptarem e escoltarem o traidor a Paris. A idéia é julgá-lo e executá-lo. Porém, Paris fica muito longe e nada corre como planejado.

Lembro que este The Hit foi um dos filmes mais comentados nos anos 80, mas apenas agora com seu lançamento em dvd poderemos realmente avaliar se aquilo que comentaram a respeito dele é verdadeiro ou se o filme está datado e perdeu seu impacto. Talvez sim, talvez não, mas acredito que valha a pena ver ou rever este legitimo produto do cinema inglês realizado em 1984.
Humberto Oliveira

Os Infiltrados (The Departed, 2006)

Esta terceira parceria entre o cineasta Martin Scorsese e o astro Leonardo Di Caprio, pode finalmente render um Oscar de Melhor diretor para Scorsese que vem sendo preterido ano após ano pela Academia.

No entanto, esta premiação pode estar ameaçada de não acontecer por três motivos – Cartas de Iwo Jima, dirigido por Clint Eastwood, que disputa cabeça a cabeça com o filme de Scorsese. Lembramos que O Aviador de Scorsese perdeu para Menina de Ouro de Eastwood e mesmo que digam que um raio não cai duas vezes no mesmo lugar, tudo pode acontecer.

Outro problema pode ser também o longa-metragem Babel, estrelado por Brad Pitt e que está fazendo relativo sucesso apesar de algumas críticas negativas quanto à confusão do roteiro que recheou o filme com inúmeras idas e vindas graças às histórias paralelas e o pior problema de todos consiste no fato de Os Infiltrados ser uma refilmagem baseada numa trilogia vinda da China intitulada Conflitos internos (2002/2003). Como um amigo falou que achava estranho que Scorsese, que merecia ter ganho Oscar por filmes como Táxi Driver, Touro Indomável e Os Bons Companheiros, venha a ganhar exatamente por uma refilmagem. Mas resta agora apenas esperarmos a entrega dos prêmios. Boa sorte para Martin Scorsese.

Depois de Gangues de Nova York e O Aviador, Di Caprio retorna sob a batuta de Scorsese neste Os Infiltrados, que traz ainda Jack Nicholson como um violento chefão mafioso de Boston chamado Frank Costello que o departamento de polícia de Boston está investigando e quer acabar com seu reinado de crimes. Para tanto, Billy Costigan, vivido por Di Caprio, é o policial disfarçado que recebe a missão de se infiltrar na quadrilha e assim reunir provas contra o chefão, mas ao mesmo tempo Costello, que desconfia que a polícia enviou alguém para espioná-lo, toma o mesmo caminho e consegue que um dos seus protegidos faça parte da equipe que o investiga. A partir de então o filme se transforma num jogo de gato e rato mostrando cada um dos espiões – Di Caprio para a polícia e Matt Damon para Costello – óbvio que tudo isso não pode acabar bem de forma algum para nenhum dos lados.

Ainda no elenco, Martin Sheen, Alec Baldwin e Mark Wahlberg. Na equipe técnica do filme Scorsese se cercou dos colaboradores de sempre como o diretor de fotografia Michael Ballhaus e a montadora Thelma Schoonmaker.

Os Infiltrados apesar de ter recebido algumas indicações para o Oscar passou longe de ser exibido nos cinemas de Porto Velho e mais uma vez ficamos a ver navios, pois o exibidor fez questão de trazer nulidades como Xuxa gêmeas, que infelizmente não serve de consolo nem para os "baixinhos".
Humberto Oliveira
O MAIOR ESPETÁCULO DA TERRA AGORA EM DVD

A partir de 13 de fevereiro os cinéfilos chegados a um grande espetáculo, repleto de cores, elenco de estrelas e tendo na direção ninguém menos que um obcecado pela perfeição nos mínimos detalhes, terão seu desejo realizado. Chega finalmente em dvd o clássico O maior espetáculo da terra (The Greatest Show on Earth) dirigido em 1952 pelo megalômano Cecil B. De Mille, a dois passos de realizar ainda um projeto ainda maior – Os Dez Mandamentos, que seria então o seu último filme.

Muitos disseram que o principal mérito do filme é a grandiosidade com que Cecil B. DeMille retrata o empreendimento circense, definido nas palavras do próprio realizador como "um incansável gigante em movimento". Mas o filme é bem mais que isso. O maior espetáculo da terra é um misto de show de circo, recheado de dramas pessoais que tem como pano de fundo o dia a dia daqueles que trabalham sob a lona de um circo, no caso um de verdade que o diretor e sua equipe acompanharam durante um ano para captar a realidade daquelas pessoas, seu esforço, seus sonhos, tristezas, vitórias, mas acima de tudo seu companheirismo em momentos de tragédia.

O elenco inclui nomes como Betty Hutton, Cornel Wilde, Charlton Heston (que interpretaria ninguém menos que Moises em Os Dez Mandamentos), Dorothy Lamour, Gloria Grahame e James Stewart que passa o filme inteiro com o rosto pintado sendo revelado apenas no final do filme o porquê do disfarce.

Charlton Heston faz Brad Braden, o chefe com serragem nas veias, que mantém a qualquer custo o circo Ringling Brothers and Barnum & Bailey em pé. Cornel Wilde é o Grande Sebastian, um lendário trapezista que se rivaliza com Braden pela conquista de Holly (Betty Hutton). Ao lado do trio protagonista contracena uma dupla mais sombria: o palhaço Butons (James Stewart), ex-médico procurado pelo assassinato da mulher, e Klau (Lyle Bettger), um domador de elefantes sádico. Todos vivem momentos de apreensão e euforia, erguendo e reerguendo o espetáculo em cada cidade; porque chova ou faça sol, o show deve continuar.
Humberto Oliveira